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Lifestyle

19 de Maio de 2019

Gordofobia: infinitos particulares

A partir do lançamento de livros sobre alimentação, autoestima e indústria da beleza, Pause conversou com nutricionistas, modelos e especialistas para entender como a gordofobia está presente na vida das brasileiras

Foto: PABLO SABORIDOFoto: PABLO SABORIDO
Fluvia Lacerda em fotografia de PABLO SABORIDO. Maquiagem e cabelo de DINDI HOJAH

"Ela era tão bonita, mas engordou". "Ela se descuidou da saúde e ficou gorda". "Ela ficaria mais bonita se emagrecesse uns quilos". As frases que iniciam esse parágrafo são constantes na vida de muitas brasileiras. Oprimidas por um padrão que valoriza o corpo magro, influenciadas por redes sociais que vendem vidas perfeitas e, principalmente, aprendendo desde cedo que ser gorda é sinônimo de ser feia, as mulheres - gordas ou magras - convivem quase diariamente com a gordofobia. Inspirado pelo lançamento recente de livros que abordam alimentação, patriarcado, autoestima e indústria da beleza - Pause debate, hoje, como persiste o preconceito contra o corpo gordo.


"As pessoas têm medo de engordar, de serem vistas ou identificadas como gordas pois, pelo menos na nossa sociedade, ser gordo é a pior coisa que um ser humano pode deixar acontecer com ele mesmo", aponta a nutricionista Paola Altheia - que lançou recentemente o livro Não Sou Exposição. Por ser uma condição mutável - diferente da cor da pele ou da orientação sexual - ter um corpo gordo se torna alvo de tantas críticas. Esse tipo de preconceito, explica Paola - que compartilha suas experiências no instagram (@naosouexposicao) - tem profundas razões históricas. Quando foram instituídos os pecados e as virtudes capitais, a gula se tornou oposto da temperança. Por isso, aprendemos desde cedo que o gordo - aquela pessoa que teoricamente come muito - não consegue ter controle sobre seus atos e suas vontades. 

Amanda Lima, jornalista e idealizadora da Revista Hilda - que trata sobre o universo plus size e o movimento body positive - acredita que o ato de emagrecer é colocado como uma conquista. Quem nunca ouviu, afinal, mulheres serem parabenizadas por terem perdido peso? "As pessoas vão consumir produtos e serviços baseadas em um momento de infelicidade ou inconformidade com quem ela é. Isso faz a indústria gerar produtos. Essa pressão estética faz com que a mulher se sinta culpada por não ter aquele corpo. E faz com que ela não se sinta bonita o suficiente", diz Amanda.

Foto: PABLO SABORIDOFoto: PABLO SABORIDO
Fluvia Lacerda em fotografia de Pablo Saborido. Maquiagem e cabelo de Dindi Hojah
"E ainda temos a questão médica, que é a acusação de que a pessoa gorda não é saudável, de que ela vai ter doenças", lembra Paola. Atualmente, entretanto, não há provas científicas garantindo que ser gordo é equivalente a não ter saúde. "Foi definido um corpo gordo como não saudável por um método matemático que data de 200 anos (Índice de Massa Corporal, o IMC). Não podemos dizer que o corpo gordo não tem saúde só olhando para ele. Os estudos já vêm mostrando isso. Ele pode ter tanta saúde quanto um corpo que está dentro do IMC", diz a cearense Pabyle Flauzino, que utiliza o instagram (@nutri.des.construida) para apresentar novas perspectivas sobre alimentação, aceitação do próprio corpo e comportamento. 

"Ser gordo é superficialmente julgado em grande parte como uma questão apenas de escolha. O gordo é vilificado de uma forma imperdoável e encaixado num molde frequentemente generalizado, sempre estereotipado. E somente hoje temos pessoas de destaque na mídia pra se erguer contra tudo isso", elucida a modelo Fluvia Lacerda, autora do livro Gorda Não É Palavrão. Mas, apesar de vários tipos de corpos e belezas estarem ganhando espaço nas redes sociais e nos veículos de comunicação, ainda é forte a presença do corpo magro como único objetivo desejável. Foi para apresentar uma nova perspectiva que Pabyle começou a usar as redes sociais. "Percebi demanda de pessoas que se identificavam comigo e de pessoas que estavam saturadas de ter essa alimentação perfeita. Não quero alimentação perfeita, quero alimentação possível", diz Pabyle, que é mestranda em Nutrição e Saúde pela Universidade Estadual do Ceará.
 
Para se inspirar!
"A força que a mídia sempre teve sobre a mente das mulheres é inegável! Mas graças a essa revolução que vivemos hoje com a existência das redes sociais, estamos aos poucos saindo dessa manipulação", diz Fluvia Lacerda.
 
"Nos últimos tempos, aconteceu um boom da moda plus size que trouxe a discussão da gordofobia à tona. Mas muito se foca em moda, em ter representatividade. Entretanto, o corpo gordo vai além disso", diz Amanda Lima, jornalista e idealizadora da Revista Hilda 
 
"Ser gordo não está relacionado só com o que a pessoa coloca na boca. Tem a questão da genética, tem a questão da família, da educação, de onde ela mora, do poder aquisitivo, tem o acesso aos alimentos saudáveis, tem as questões emocionais", aponta a nutricionista Paola Altheia.

"A gordofobia é histórica. Temos dados de 1800 sobre autores falando do corpo gordo como um corpo não saudável. Existe uma patologização do corpo gordo. "Obesidade é doença"., eles dizem. Esse discurso justifica não ser aceito e não ser falado. A gordofobia é velada. Muitas pessoas sofrem, mas pouquíssimas reconhecem que são gordofóbicas", diz a nutricionista Pabyle Flauzino.